segunda-feira, 24 de março de 2014

Ela fez café pra mim

Ouça enquanto lê
Quarta-Feira, 29 de março, 17:50 da tarde. Eu não conseguia parar de olhar o relógio. Resolvi pegar um livro. Folheei umas páginas, li umas duas ou três frases e me lembrei que nem tinha prestado atenção no nome do livro...
Quatro batidas. Levantei da poltrona num pulo, larguei o livro que caiu no chão e sei lá mais o que eu derrubei. Tropecei nos meus próprios pés umas quantas vezes até chegar à porta. Me apoiei na maçaneta e não consegui puxar a porta sem fazer um barulho estrondoso que entregasse meu nervosismo. Masss, tô nem aí. 

-Oi de novo
Ela não parava de sorrir. Pensei que talvez tivesse gostado de mim. Tomara.
-Cheguei na hora errada?
-Hora errada? Não. Não! Não…chegou na hora de entrar.
 Ela riu de novo. Que diabos tu quer comigo, guria? Vai parar com isso não? Já tá virando sacanagem.
-Vou parecer muito oferecida se aceitar o convite?
-Não mais do que eu quero que seja. — Eu ri também. Foi uma sensação esquisita ela ter gostado da piada.
-Onde é que eu coloco isso aqui?
-Deixa no braço da poltrona mesmo. A gente vai acabar comendo durante a conversa.
-Ah, é? E vamos conversar sobre o quê?
-Sei lá, uai.
Eu juro que fiquei olhando pra ela por uns cinco minutos até que resolvi me pronunciar. O silêncio tava me matando.
-Aceita, sei lá, um refrigerante?
-Não tomo refrigerante…
-Chá? Café? Água?
-Café, pode ser.
-Então tu vai ter que fazer porque eu não sei. — Rimos.
-Tem pó?
-Tem, sim.
E se eu te disser que sabia fazer café? Sempre soube. Sei lá, só pensei que ela acharia engraçado. Funcionou. 
-Posso pegar gelo?
-An? Gelo?
-Gelo. Posso?
-Claro, mas gelo pra quê?
-Café, uai. Não gosta?
-Hmm, na verdade não. Não que eu saiba.
-Já provou?
-Não me parece nada legal.
-Prova aqui.
Ela jogou as pedras de gelo na xícara e estendeu-a pra mim de forma que quase passei a respirar café.
-Não, tô de boa. Pode tomar seu café aí.
Ela riu de novo. Puta merda.
-Prova logo, estranho.
            Ela estendeu a xícara de novo e eu quase que me senti obrigado pela minha própria vontade a engolir aquilo. Mas cara, era horrível. Hor rí vel. Eu gostei.
-Até que é bom, estranha.
-Hm, sei. Essa cara aí de quem gostou. Imagina se não tivesse gostado. –Ela falou aquilo dando a maior risada da minha cara.
            Ela se apoiou de costas na pia e eu me apoiei do lado.
-E aí, o que tava lendo?
-Eu?
-Você.
-Nada, por quê?
-Vi um livro no chão da sala. Deu vontade de pegar, mas preferi ficar imóvel e te deixar constrangido.
-É Luís de Camões.
-Poesia! Quem diria ein! Qual a sua favorita?
-Não cheguei a ler. Li umas frases que juntas formariam meia página, no máximo.
Ela me encarou por uns segundos e me puxou pela mão até o sofá. A ficha de ela ter me pegado pela mão demorou a cair. Sentou na minha poltrona e cruzou as pernas numa daquelas posições de borboleta de ginástica.
-E aí?
-E aí o quê?
-O que tava fazendo antes de eu chegar?
-Ouvindo música, tomando refrigerante... O de sempre. E você, tava fazendo o que antes de vir pra cá?
-Nada, na verdade. Cochilando.
-Tendi...
-Ei!! Tive uma ideia. – Quase dei um pulo.
-Fala!
-Me diz as coisas que você gosta, que eu te digo do que gosto.
-Não dá... Tenho vergonha de falar… - ela devia tá pensando como eu era broxante.
-Ixi! Então escreve.
-O quê?
-Escreve! Sabe escrever? É fácil. A gente normalmente aprende isso no pré. — Não me segurei, tive que rir. E me senti envergonhado ao mesmo tempo, ela não parava de olhar. Me senti desconfortável e realizado ao mesmo tempo.
Sei lá, e se ela tivesse gostado de mim? E se a ruivinha dos dedos finos e pés pequenininhos estivesse gostando de mim? Que puta sorte. Eu ainda não tinha entendido qual o entusiasmo, mas não dava pra tirar o sorriso da cara. Era normal, não? Alguém gostar da gente? Costumava ser normal no Ensino Médio. No Ensino Médio, na faculdade, no trabalho, nas festas. Sempre tinha alguém a fim.

Sei que o jeito como ela me olhava me deixava sem reação. E o cheiro dela, então? Suspirar perto dela dava uma vontade enorme de beijar. Eu tinha vontade de tudo com ela.

[Continua]

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